domingo, janeiro 25

Again


Novamente ida; novamente eu; novamente.
Um beijo terno e, até ao breve regresso, um poema:


quantas vezes te inventei
ao pé das águas do lago e
imaginei que me empurravas
ladeira abaixo para
enfim
morrer de amor


valter hugo mãe in o resto da minha alegria

sábado, janeiro 17

2002, mind deambulation


Passo a passo, desce ou sobe, passo a passo perto do infinito entre os braços de um livro, folha estendida em chão ou mesa ou mão, ou até água que a leve para longe, tão longe como o tempo que falta até um dia viajar até. Até onde Deus quiser, até onde eu quiser, eu crio os meus próprios feitos, vontades, a vontade de subir ou descer, os meus passos, passo a passo até onde eu for, até. Até te pedir larga a mão, tira a mão deixa, deixa-me correr ir até ali, até onde eu quiser ou até ao infinito, até ao centro de um livro, sim, aquele, até ao centro de todos os lados daquele que eu li, e foi há tempos, não me recordo já não lembro, mas foi – até lá que eu viajei – até. Pára de puxar, não largas, pedi e volto a pedir e é dito ou feito, dito e feito, quem sabe se tu não me verás através dessas frestas que tens nos olhos – dizes-lhes tu e tantos pálpebras, mas tu nunca as abres – eu sei – tu nunca vês o que há para ser visto, além do que passa no ecrã. E se eu quiser não serás tu a impedir-me de me atirar lá de cima, porque eu quero e posso à hora que me apetecer jogar-me de uma ravina, para ti acidentalmente e para tantos mais atentado à própria vida, e também passo a passo eu caminharei até lá – sim eu sei cansa o tempo que demoro a dar cada passo, mas eu daqui não me movo, e traga-me por favor um número maior, já disse que não calço 38, e em preto - não gosto de castanho – a rejeição é viúva de todo o resto e quero-a sempre aos meus pés. Egoísmo, para quem não o entende é este estado em que a vida passa e não deixa nada além do que oferece ao tempo e o tempo esse foge e corre a uma velocidade maior, e os dias passam, os anos passam, e quando é que foi que eu nasci mesmo que já nem me lembro, e no fim resta aquela generosidade toda que é a memória mas afinal do que vale se nos últimos dias já nem isso vale. E esgotam-se os passos e eu estou cá em cima, quem me dera estar lá em baixo, afinal o sol nasce deste lado e morre daquele, e é aqui que brota a luz do que é viver – e será que sei o que é a vida – eu sei que a vida é, e sei que a vida passa, mas não sei por quem passa e se serei só eu que a sinto tão perto de mim, do movimento. E o meu cérebro move-se as células mexem-se, dizem-lhes neurónios, e se o meu QI for baixo – eu nem sou tão inteligente, eu não sou tão burra – e imagino, imagina tu então onde eu estarei, será que criaste um espaço ou imaginaste-me apenas a sonhar, em completa deambulação nocturna de braços estendidos para a frente – como nos filmes – sim como nos filmes murmurando coisas; sons; palavras; gritos sentando-me e estendendo o pé como se trocasse um sapato, e agora se eu te disser quero água tragam-me por favor um quarto de desespero, ou quem sabe meio litro de lágrimas naturais – com gás fica sempre mais difícil ingerir… pois sou louca mas tu nunca irás entender, pois não só de loucura vive o homem, diz-me então se o pensamento corre mais rápido que a luz ou o tempo, ou se cada passo que eu dou até ao entardecer não pode ser dado em falso. Tu não sabes se escrevi e caminhei, ou se por acaso já caí, caderno na mão e ferida no joelho, por favor não carregue aí que eu magoei-me, e o bife - nunca mais vem? - A cadeira balança e chia, não foi a porta, afinal as grades não foram oleadas, então para quê este pé direito duplo, a cama na parede e não no chão, e se aquilo de noite falhar e me estraçalhar entre o colchão e a parede, pode ser então que todos os meus passos até aqui sejam em vão, e então eu nunca chegarei até lá. Até onde eu for – até. Traga a conta e fique com o troco que eu já estou atrasada, não vê que já é de noite, e eu aqui como se não tivesse nada que fazer… desço as escadas.


quarta-feira, janeiro 14

As pessoas são dádivas


As pessoas são dádivas de Deus para mim.
Já vêm embrulhadas, algumas lindamente e outras de modo menos atraente.
Algumas foram danificadas no correio; outras chegam por “entrega especial”.
Algumas estão desamarradas, outras hermeticamente fechadas. Mas o invólucro não é a dádiva e essa é uma importante descoberta. É tão fácil cometer um erro a esse respeito, julgar o conteúdo pela aparência.

Às vezes a dádiva é aberta com facilidade; às vezes é preciso a ajuda de outros. Talvez porque já tenham sido magoados antes e não queiram ser magoados de novo. Pode ser que agora se sintam mais como “coisas” do que como pessoas “humanas”.

Sou uma pessoa: como todas as outras, também sou uma dádiva. Deus encheu-me de uma bondade que é só minha. E contudo, às vezes tenho medo de olhar para dentro do meu invólucro. Talvez eu tenha medo de me desapontar. Talvez eu não confie no meu próprio conteúdo. Ou pode ser que eu nunca tenha realmente aceite a dádiva que sou.

Todo o encontro e partilha de pessoas é uma troca de dádivas. A minha dádiva sou eu; a tua és tu.
Somos dádivas um para o outro.




(escrito anónimo, citado por John Powell e Loretta Brady, Arrancar Máscaras! Abandonar papéis!)

domingo, janeiro 11

segunda-feira, janeiro 5

Pode um desejo imenso


Pode um desejo imenso
Arder no peito tanto,
Que à branda e à viva alma o fogo intenso
Lhe gaste as nódoas do terreno manto,
E purifique em tanta alteza o espírito
Com olhos imortais
Que faz que leia mais do que vê escrito.
(...)



Camões - Ode VI