sexta-feira, maio 16

Medo

Olhos. Mãos.
Quando te vi não sabia que eras tu.
Um dia pediste: abre os olhos - e eu mantive-os fechados, tão cerrados que não via nem um traço de luz.
Quando o sol nascia, não era nada comigo.
Acordava, bocejava, levava horas para me mexer.
Não te queria.
Não te via.
Não te tocava.
Solidão.
Desejo de solidão.
O tempo passava e parecia que a vida não existia, que estava apenas à espera de um motivo para morrer. E quando em segredo te olhava, tinha medo de viver.
Medo.
E no entanto procurava-te em cada recanto do dia.
Sonhava.
Imagináva-nos eternos, sem princípios nem leis, sem termos sequer nascido.
Almas.
Qualquer coisa que nunca tivesse fim.
Depois acordava e telefonava-te. Não apareças mais - pedia. E tu não aparecias.
Não entendias.
Iamos morrendo em cada dia e tu não entendias, não compreendias que não queria morrer contigo.
Ver-te crescer, envelhecer, morrer.
E perder-te.
E nunca te tive por medo de viver.