domingo, fevereiro 19

guardado

às vezes não sei o que dizer e fico com as palavras. olho só. para ti. lá fora, para o teu cabelo em equilíbrio quando atravessas a estrada. no jeito sinuoso de quem vence o vento. ou quando no estado terno do teu sono te encontro no meu peito. às vezes há coisas que nunca digo e espero que não morram. como se dizê-las fosse quebrá-las, roubar-lhes magnificência. há coisas que não digo, mas nunca esqueço: a casa que são as tuas mãos, a tua mão sobre a minha mão. os teus olhos a chamarem-me, o teu sorriso a invadir-me. perguntas em que penso e eu digo penso em nada. como se o nada cobrisse a mente e o pensamento de quem ama. como se o nada fosse maior do que o nada em que o mundo se torna. não quero dizer. não quero dizer todas as imagens, ou todos os tons da tua voz que ainda não sei como escrever. não sei escrever as tuas mãos, não posso escrever as tuas mãos. não posso escrever o beijo.

domingo, fevereiro 12

em pauta



"se o que fores dizer não for mais belo que o silêncio, então cala-te."Pitágoras

ou neste caso tanto, que lanço a sugestão: Beth Orton, comfort of strangers, Stina Nordenstam, the world is saved; Sia, colour the small one; Cat Power, the greatest; Ladytron, witching hour; Mogwai, Mr Beast; Anja Garbarek, briefly shaking; Broadcast, tender buttons; Tiga, sexor

quinta-feira, fevereiro 9

blessed love



"if this love was just mine
if this love was just yours
it could be easy to stop
but it´s not

mas a verdade é linda e pura
a gente se ama sem frescura
and my body says only yes, yes
the way you walk, the way you talk, the way you dance
you move my heart so wild
the way you touch, the way you look at me, my love
com você esse amor é bom demais

mesmo o amor tem seu segredo
de apagar as mágoas do velho enredo, de renovar para acertar

the way you think, the way you act
i understand you very well
the way you see my love fascinates me
this love is the last love
(...)"

Ive Mendes - blessed love


segunda-feira, fevereiro 6

d'os medos

mas felizmente tu estavas lá. acabada a infância e ao retorno dos lobos, só os teus braços podiam salvar-me - abraça-me por favor, abraça-me - e nos teus ombros verti o medo do inexplicável. lá fora ainda era o negro da noite e os pássaros ainda não tinham pousado na nossa janela. e o mundo caía no medo do mundo que eu não conseguia explicar. abraça-me, por favor abraça-me. e rapidamente a manhã cresceu dos teus braços e apagou o medo com o chilrear dos pássaros.
| who needs |postits

ir para casa, digo. ir contigo para casa e deixar o mundo no sítio. e mais nada parece tão certo.

domingo, fevereiro 5

procelas



sempre ouvi dos outros que há sonhos que acordam da tempestade que causam. e eu lembrava-me da infância, dos lobos e dos mantos de neve que me impediam de fugir. mamã, mamã, tive um sonho, mamã. e não dormia, mãe, não dormia se não viesses e me abraçasses. e se te mexias ou dizias ir, a minha cama era o isco no meio da alcateia. e eu não dormia. não dormia e não imaginava que às vezes há medos que nos acordam em ferida, e que os lobos voltam com a capacidade de despertar temporais. até ontem, mãe. até ontem desconhecia.

quinta-feira, fevereiro 2

as palavras (ou como escrever um poema sem escrever a própria vida)



“Mulher. As promessas. O rosto. Nunca te menti. Se te disse o céu, era o céu; se te disse sol ou água, era sol ou água; se te disse manhã, era a manhã dos teus olhos a enganar-me. Sem que os teus olhos me enganassem. O engano de uma manhã que nasceu nos teus olhos. Sonhámos. Sonhámos e fomos cegos. E não tenho medo da palavra amor. Não tenho medo das palavras. Vê como digo morte: morte morte morte morte morte. Repito-a assim e roubo-lhe o sentido. Roubo morte à morte. Roubo trevas e solidão. Morte morte morte morte morte. Não tenho medo das palavras. Torno a ver os teus olhos diante dos meus, manhã, e quero que esta seja a nossa última palavra: amor.”
José Luís Peixoto in Nenhum Olhar


vivi sempre num mundo distante onde as palavras não faziam sentido. tantas vezes me chamavam e reclamavam pronto já não estás cá e em sonhos cosia imagens e cerzia palavras que em manta geravam um artifício. e tantas vezes me acusaram de saber a minha vida, os meus sentimentos, de mim, sei o que sentes, sei o que dizes, sei o que pensas, quando tantas vezes fingi. desculpa-me se nem sempre fui sincera e só para ti fui sincera - só para ti fui sincera - digo-o assim pois também eu não tenho medo das palavras. menti. menti. menti mas nunca te menti e sei, desde a primeira vez que adormeci com as palavras, como o seu séquito as alegoriza. e continuo a cerzi-las e a ferir os dedos quando elas não fazem sentido, e elas nunca fazem sentido. só quando as escondo no livro onde só para ti vivem, só se forem tuas. só se as palavras forem nossas.