domingo, junho 15

Viagem

Lembro-me que me olhavas com a tristeza de quem se acabou de perder de si mesmo. Pousavas-me a mão no ombro e perguntavas, entre soluços, “o que faço? o que faço? diz-me o que faço..?” e eu respondia-te que não sabia, que era injusto julgares-te perdido se nunca tinhas fugido de ti mesmo. Nessa altura já não sabia mais se era a tristeza ou se a incerteza que te tinha assaltado a alma.
Tu sabes que a vida consegue ser injusta e nem sempre temos a sorte de encontrar as pessoas na altura certa. Então ficamos com a sensação que somos obrigados a seguir em frente (porque a vida não pára) por um caminho húmido e escuro, onde não conseguimos sequer ver os próprios pés, e onde somos inevitavelmente forçados a pisar alguém ou a escorregar e a cair no chão. Só que antes disso vem a dor - os teus olhos. Antes disso vem a convicção de que um dia todas as certezas caem por terra, todas excepto a de estarmos perdidos, e só depois entendemos o que é afinal a tristeza.

- Já não me lembrava como era permanecer acordado pela noite fora - dizias-me - adormecer por instantes e acordar com a cara submersa em lágrimas, de angústia, sempre de angústia e desespero, de sobressalto.

Gostava de ter os braços maiores para te poder abraçar todo, te apertar e conseguir salvar do inevitável. Mas tu sabes que terás que caminhar às escuras e pisar muito do que se interpuser entre ti e a tua saída, tu sabes que provavelmente escorregarás e cairás mais do que o suposto, porque eu sei que não suportas o peso que é magoar alguém. Então transportar?s toda a raiva e dor só para ti, e eu só te posso assegurar que vou estar aqui - podes ter a certeza que eu estou sempre aqui - sempre, sempre para te ajudar, mesmo que do outro lado do espelho.